Sunday, August 19, 2007

19.08.2007 (Domingo) - No Rio, o último dia no Brasil

Hoje seria o “suposto” dia para descansar. Para passar o dia na praia e relaxar. Pois, esse era o plano. Mas não aconteceu assim... Sinto como um “detective urbano” à procura de pistas para uma hipótese, muitas vezes inexistente. Começa-se com uma intuição, uma ideia e uma pergunta elabora-se: “e se ?” . Daí para a frente é tempo para testá-la através de um jogo perceptual e aprofundamento na história. Esse tem sido o meu método, já que o tempo disponível repartido para cada cidade somente permite isso. No primeiro dia tenho procurado descodificar a área de fundação (ou imediata extensão) através de mapeamento perceptual e cognitivo. No segundo dia desenvolvo uma hipótese e procuro encontrar ou historiador, geógrafo, guia ou arquitecto para trocar considerações acerca da cidade. Geralmente gosto de falar com historiadores pois penso que o papel do arquitecto e urbanista é o de interpretar espacial fisicamente dados económicos, sociais e culturais. Há uma série de dados que, ao serem interpretado espacialmente, conferem novas leituras acerca da cidade; Como o Rossi nos lembrou não são só os monumentos que falam acerca das sociedades que os fazem. As cidades têm emoções e pulsares que muitas vezes estão longe do conhecimento de arquitectos... É no terceiro dia tenho captado imagens e recolhido iconografia/cartografia que irá suportar aquela ideia ou especulação. Isto foi tudo para dizer que no Domingo ainda não tinha conseguido apurado consistentemente a minha ideia acerca do Rio de Janeiro. Necessitaria de ouvir mais opiniões acerca do Rio e ainda faltavam-me alguns dados. Procurei um guia que me guiasse pelo Rio Colonial e marquei um encontro para as 13.00. Até lá percorremos Ipanema. O tráfego estava encerrado e tanto a praia como o calçadão estava cheio de gente, outra vez, de todas as idades e sexos. Pessoas movimentavam-se para cima e para baixo da Avenida e na praia grupos de jovens praticavam ou futebol, ou voleybol, ou simplesmente exercitavam-se. No calçadão hippies vendiam o seu artesanato e crianças descalças pediam 1 real para o arroz... Enquanto isso, senhoras passeavam os seus cachorros delicadamente vestidos em tufe e calçados com luvinhas de pele ! Ali todos se juntavam e partilhavam o mesmo espaço.

Encontrei-me com Carlos Roquete no edifício do Paço, um historiador do Rio e impulsionador da recuperação do centro histórico do Rio que tem ocorrido nas últimos décadas.

Começámos pela exposição do edifício do Paço acerca do Rio no início do séc. XIX quando a família real se instalou na cidade. Esta não só oferecia a exuberância cenográfica à altura Imperial mas também estava estrategicamente localizada nas rotas comerciais. O Plano que se exibia nas paredes era o do 1744, que para além do Rio colonial da Rua direita, Morro do Castelo e Mosteiro de S. Bento, exibia as extensões para Norte do séc. XVII. Falei-lhe que estava interessada em saber mais acerca do Rio colonial pois acreditava que a relação funcional com a frente marítima em muito tinha marcado a urbanidade do Rio. Carlos finalmente confirmava esta minha suposição ! Rio, a cidade em si, sempre foi uma cidade charmosa em que a beleza natural se impunha e poucas preocupações defensivas existiam no seu centro já que a entrada da baía estava dominada por fortes e artilharia militar que antecipavam ameaças. A cidade não ocupou as partes mais altas na topografia mas sim a zona protegida entre 2 morros que oferecia as melhores condições para o Porto e para as trocas comerciais. Desde cedo Rio tinha sido um importante Porto e uma cidade administrativa e por estes factores concentrava uma complexa urbanidade entre a borda da água e o imediato offset desta, a Rua Direita. Em vez de se criar uma outra ordem espacial a rua direita simplesmente “copiou” o formato da linha de água, elemento fundamental na vida da cidade! Carlos, falou-me que o chafariz era um importante elemento cívico do séc. XVIII onde a cidade colhia a água potável. No Rio a água potável era um bem. Era então no Terreiro que os negros se juntavam nas suas tarefas e os nobres se exibiam. Hoje o centro da cidade é maioritariamente administrativo retirando muita da complexidade que outrora existiu. Se quisermos presenciar aquela complexidade e urbanidade temos de visitar Copacabana, ou Ipanema onde o borbulhar da cidade de faz vivo e o cheiro a mar sentir com a dominante Natureza a servir de pano de fundo.
No caminho de volta tomámos o autocarro até Ipanema. Na praça da N.S. da Paz uma imensa feira de artesanato acontecia. Finalmente era tempo de fazer compras para a família e ocupar os pouquinhos espaços vazios das nossas malas.
Sendo a última noite no Brasil, deste rico percurso pela história e memória das cidades Atlânticas do século XVI, era tempo de comemorar com um jantar delicioso e um vinho tinto à altura ! Bem haja e saúde ! Sentia-me triste e simultaneamente revigorada por toda a informação a que fomos expostos e agraciados pela receptividade com que sempre fomos recebidos. E, tal como um viajante sentia-me com vontade de saber mais e de partilhar tudo o que recebi com outras pessoas também interessadas por cidades e culturas. É assim que me vejo actualmente !